A Deliberação Tomada pelos Ratos
Rodilardo, gato voraz,
aprontou entre os ratos tal matança,
que deu cabo de sua paz,
de tantos que matava e guardava na pança.
Os poucos que sobraram não se aventuravam
a sair dos buracos: mal se alimentavam.
Para eles, Rodilardo era mais que um gato:
era o próprio Satã, de fato.
Um dia em que, pelos telhados,
foi o galante namorar,
aproveitando a trégua, os ratos, assustados,
resolveram confabular
e discutir um modo de solucionar
esse grave problema. O decano, prudente,
definiu a questão: simples falta de aviso,
já que o gato chegava, solerte. Era urgente
amarrar-lhe ao pescoço um guizo,
concluiu o decano, rato de juízo.
Acharam a ideia excelente,
e aplaudiram seu autor. Restava, todavia,
um pequeno detalhe a ser solucionado:
quem prenderia o guizo – e qual se atreveria?
Um se esquivou, dizendo estar muito ocupado;
Outro alegou que andava um tanto destreinado
em dar laços e nós. E a bela ideia
teve triste final. Muita assembleia, ao fim nada decide – mesmo sendo de frades
ou de veneráveis abades…
Deliberar, deliberar …
conselheiros, existem vários;
mas quando é para executar,
onde estarão os voluntários?
(Fábulas de La Fontaine. Tradução de Milton Amado e Eugênia Amado. Belo Horizonte: Itatiaia, 2003, p. 134-136.)